Profissional do Sexo não tem sentimentos?

Ontem a noite recebi o contato de um rapaz, muito educado, dizendo que visitou o blog, que achou legal, etc... Mas que gostaria de que eu o “indicasse” uma trans já operada, que era seu sonho namorar alguém assim. Mas, porém (sempre tem um) que desejava alguém que não tivesse um passado de prostituição, pois desejava um relacionamento sério!

Assim como ele busquei ser educada na resposta, dizendo não ser a finalidade desse blog ser uma agência de namoros nem promover a aproximação de pessoas com fins amorosos ou sexuais.

Até porque isso já implicaria em outras instâncias como até mesmo a segurança de pessoas por mim aproximadas, etc.

Observei também em minha resposta, a necessidade de ele rever seu olhar sobre as pessoas que se prostituem, pois são seres humanos, tem sentimentos e por (muitas) vezes até relacionamentos sérios e verdadeiros, além de duradouros.

Sem mais, ele desculpou-se dizendo não ter desejado parecer preconceituoso e despediu-se.

Fiquei pensando por horas:

Porque as pessoas, em primeiro lugar, associam a travesti (e a transexual por conseqüência) com a prostituição? Porque seria tão deprecioso e grave alguém ter no passado sido profissional do sexo? Porque essa “mancha” seria eterna e tornaria essa pessoa menos capacitada a dar e receber amor, ser fiel e cuidadora da pessoa amada? Uma pessoa assim não seria mais um ser humano? Ah, ta!

Então, creio que quem na verdade não tem condições de amar de verdade seria quem desprezasse alguém pelo que foi, ou pela profissão que exerce, não por seu interior e valores pessoais. Conheço prostitutas que são mães valorosas e amorosas, boas donas de casa e esposas.

Tal quase inevitável associação entre as TT’s e a prostituição ficou explicita também em outra ocasião, quando estava eu na Associação de Travestis e Transexuais na qual trabalhava e era secretária-geral, e um homem ligou querendo saber se tinha algum site na Internet onde ele pudesse ver as fotos das meninas para contratar o programa. A tendente respondendo com uma negativa, ele pergunta se não teria nenhuma ali naquele momento para atendê-lo. Mesmo com as explicações de que ali funcionava uma associação e não uma agência, ele insistia no equivoco, e por fim, entendeu e desistiu contrariado...

É também comum, ao transitarmos pelas ruas, parques e shoppings, sermos abordadas com a pergunta direta de “quanto é o programa”, e isso geralmente é muito constrangedor. Pois parece que somos apenas isso, sexo e prostituição, e não temos direito á lazer, caminhadas e passeios sem interrupções ou abordagens constrangedoras.

Certa vez, quando ainda morava com minha mãe, a vizinha da frente era prostituta, e a noite, quando saia para trabalhar, deixava sua filha na casa de uma irmã e a casa ficava só. Então resolveu instalar um sistema de alarme, devido aos casos de roubos locais.

Ouvi uns gritos e fui em sua casa ver o que havia acontecido. Ela contou-me que o rapaz perguntou-lhe a razão do alarme, pois a casa era toda cercada de muros e grades, então ela revelou que trabalhava a noite, etc... Ele rapidamente propôs que se ela fizesse um programa com ele, instalaria o alarme de graça!

Ela ficou revoltada e gritava a ele, que “a noite, com suas roupas de trabalho e em seu local de trabalho, ele era uma profissional do sexo, mas naquele momento, em sua casa e com sua filha ela era apenas uma mãe. E o botou pra correr.

Senti tanto orgulho daquela atitude da minha amiga e vizinha, que relatei o acontecido para tantas pessoas quanto eu tivesse a oportunidade. Pois eu também, por não ter nenhum contato com a prostituição até então, e nem com pessoas que se prostituíam, tinha pré-conceitos e julgava essas como pessoas vulgares, promiscuas e sem “valores” morais.

Hoje, depois de ter passado pela prostituição, ter conhecido um universo de pessoas e histórias, sei bem que a realidade é outra em muitos casos. E que devemos olhar (ou tentar) além da figura que dança na boate, que batalha o dia a dia nas boates ou que aguarda por clientes nas esquinas. Por detrás daquelas quase-roupas de tão curtas em alguns casos, de tanta maquiagem, de alguns relatos negativos vinculados na mídia em geral, muitas vezes tem meninas, meninos, mães, esposas, esperanças, sonhos, VIDAS e histórias a serem conhecidas e respeitadas. Nem todo mundo chega na prostituição por desejo voluntário, sonho de infância ou para ter uma “vida fácil”, e eu sei bem disso devido às minhas próprias vivências e as marcas deixadas pela prostituição! E isso sim, de repente poderia trazer algum problema em relações sentimentais no futuro, dependendo da estrutura emocional e psicológica da pessoa que foi profissional do sexo.

Como disse em um post mais antigo, fiquei mais endurecida após ter passado pela prostituição (o que não diminuiu minha capacidade de amar), era algo que realmente eu JAMAIS gostaria de ter passado, que trouxe benefícios sim, mas as marcas serão difíceis de apagar. Mas esta sou eu, e expresso somente os meus sentimentos, pois tenho ciência de que algumas pessoas curtem e desejam permanecer na prostituição até se aposentar. Como uma senhora que tive o máximo prazer e satisfação de conhecer em um congresso, Gabriela Leite. Orgulhosa de ser (ou ter sido) puta. E além, de ser uma MULHER normal, mãe, avó, cidadã. Fascina vê-la com uma expressão meiga e suave tricotando ou fazendo algum outro trabalho manual. E ouvir suas histórias é um privilégio que ainda desejo ter novamente, pois por alguns minutos, tive orgulho de ser puta!!!


















6 comentários:

  1. Que texto lindo, diga não ao preconceito e obrigada pela lição de vida neste texto maravilhoso

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  2. Obrigada pelo carinho de suas palavras, Julia!
    É pensando em pessoas como voce que escrevo...
    Beijinhos e sinta-se a vontade para voltar e comentar sempre!!!

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  3. Adorei o texto Cris... Muito profundo e íntimo, de fato, muito especial. Não é sempre que se tem a oportunidade de conhecer alguém com a integridade moral e de espírito como você!
    Parabéns por ser quem é, por lutar pelo que acredita e nunca ter aberto mão da sua própria alma e e dos seus sonhos! Muita luz para você e que Deus lhe proteja sempre!!!

    Beijinhos,

    Aninha.

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  4. Aninha;
    primeiro, seja muito bem-vinda ao blog, e obrigada por seu comntário.
    Realmente,jamais devemos desistir de nossos sonhos, pois mesmo que estejamos passando por adversidades sempre vale a pena lutar pelo o que acreditamos.
    Como diz aquela frase: "O sacrificio pode passar logo; mas desistir, é para sempre"!!!
    Receba todo o meu carinho. Beijinhos. Cris.

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  5. Ola, adoro suas iniciativas.

    Quanto ao questionamento do blog, pode falar pro rapaz e pra todos que profissionais do sexo amam sim.

    Não tenho a menor dúvida que se apaixonam, choram, amam, sonham.

    Nunca imaginei um dia eu me apaixonar por uma trans profissional do sexo, sempre tive um lance estava mais ligado a tara, a um desejo sexual, como este rapaz aí ou como muitos homens.

    Pois que me apaixonei e estou amando uma. Tive os momentos mais felizes da minha vida com ela, formamos um casal lindo de verdade, de andar de mãos dadas pelo shopping e pelas ruas, irmos ao restaurante, baladas, cinema, etc.

    Mas como sempre tem um mas eu a perdi. Não pra sempre, pois ainda seremos um do outro.

    Se interessar, convido para acessar esse site onde eu conto a minha história com ela.

    Ainda é tudo muito recente e sempre posto novos contos que falam das minhas histórias reais com ela.

    http://www.recantodasletras.com.br/autores/pimentamarte

    Abraços

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  6. Pimenta querido, obrigada por sua visita ao meu blog, e pelo seu comentário. Um relato pessoal de que as profissionais do sexo amam e são amadas como seres humanos que são!
    Sua história emocionou-me tanto que nem pudee esperar até amanhã para escrever sobre ela.
    sua amada tem sorte por ter seu amor, e voce teve sorte igualmente ao encontra-la e conhecer um mundo (verdadeiro) de uma profissional do sexo! Beijinhos e volte sempre!

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